sexta-feira, 27 de maio de 2016

Cidades tecnológicas e inteligentes, tecnológicas ou inteligentes, inteligentes ou tecnológicas


A leitura do livro O Marketing Depois de Amanhã de Ricardo Cavallini e o artigo Cidades Inteligentes de André Lemos me inspirou a pesquisar um pouco mais sobre a evolução das cidades digitais para inteligentes e a relação da tecnologia entre consumidores e marcas.

Nos anos 1990, as cidades digitais se referiam aos computadores e a presença da internet no espaço urbano. Sem muita aplicação prática nos contextos sociais, políticos e econômicos já influenciavam na automação de processos.

Hoje o termo cidades inteligentes, do inglês smart cities, refere-se à informatização de processos em diversos contextos, integrados a um gigantesco volume de dados (Big data). Além da referência às redes em nuvens e à comunicação entre diversos objetos (internet das coisas).



Quando pessoas, empresas e governos baseiam-se no formato das cidades inteligentes, têm como objetivo evoluir seus processos para um patamar mais eficiente e sustentável.

Nos mais diferentes contextos, social, ecológico, político ou econômico, o foco das cidades inteligentes está nos projetos que visam a economia, a mobilidade urbana, o meio ambiente e os cidadãos. O foco está na formação do cidadão inteligente que é aquele que passa a ser produtor da informação e do conteúdo, que percebe os celulares e as redes sociais como instrumentos transformadores.

"O conhecimento pode gerar ações políticas e soluções criativas se moradores forem informados - de forma detalhada e sistemática - sobre índices de poluição, níveis de ruído e problemas de trânsito ou de segurança público de sua região, por exemplo." (André Lemos, 2013)

André Lemos cita no seu artigo algumas cidades que estão construindo sua inteligência, como Songdo, na Coreia do Sul, onde tudo está conectado à internet e até garrafas pet terão sensores para identificar se os moradores jogam o lixo no cesto de reciclagem correto.

"A ênfase na tecnologia pode também inibir formas mais inteligentes de lidar com os problemas."

O autor lembra da importância da tecnologia ser instrumento da evolução e não protagonista.

O uso de aplicativos, sensores e mapa pode ajudar no trânsito, mas uma solução mais viável é o incetivo ao uso da bicicleta.

A importância dos negócios e da inovação tecnológica nos projetos das cidades inteligentes pode levar à privatização do espaço público, à mecanização do cidadão em função da estrutura burocrática, ou à adoção de soluções automatizadas para o espaço urbano.

Mas e aí, qual a relação entre o marketing do depois de amanhã de Ricardo Cavallini com as cidades inteligentes de André Lemos?

Bem, a leitura seguida um do outro, me conecta com a sensação de que estamos vivendo em uma bolha transparente de tecnologia, internet e comunicação.

Novas tecnologias nos proporcionam novas experiências para comunicar, comprar, aprender, ensinar e trabalhar. Transformam os nossos processos, a forma como nos relacionamos um com os outros e com as marcas, seus princípios e seus valores.

Sinceramente, não é a tecnologia RFID usada para pagar passagens, cartões de crédito e bilhetes únicos que transformarão nosso ambiente em uma cidade inteligente, por exemplo.

O que evoluirá nossa sociedade para uma cidade inteligente, é a forma como o cidadão experimenta, aprende e utiliza as tecnologias que estão ao seu alcance.

E as marcas são cúmplices para ajudar a evoluir ou regredir nesse caminho. Mais do que nunca, as empresas possuem informações exclusivas e inéditas de seus clientes para utilizarem com um fim benéfico ou maldoso.

A política do uso de dados e da tecnologia está na ponta dos dedos de todos, desde os clientes até os diretores de marketing de grandes companhias.

Enfim, fica a dica de leitura do livro O Marketing Depois de Amanhã para se aprofundar nas tecnologias que em 2008 se apresentavam como promissoras e hoje já estão, ou não, funcionando a todo o vapor. Também, fica a indicação de leitura dos artigos de André Lemos, sempre tão atuais e provocadores.


Aproveitando o assunto e o espaço, segue fichamento de artigo também escrito por André Lemos

Celulares, funções pós-midiáticas, cidade e mobilidade - fichamento

"A cidade constitui-se, historicamente, como lugar de mobilidade e fixação, desde as primeiras organizações sociais que se formaram como lugar de culto aos mortos, as “necrópoles” (MUMFORD, 1998)"

"As cidades se desenvolvem como “sociedades em rede” (física, simbólica, cultural, política, imaginária, econômica)."

Redes telemáticas: hegemonia de um conjunto de redes, que passam a integrar, e mesmo a "comandar" (cibernética), as diversas redes que constituem o espaço urbano

Cidades cibercidades: Estas podem ser definidas como cidades onde as infraestruturas de comunicação e informação já são uma realidade e as práticas daí advindas formam uma nova urbanidade;

"Na atual fase da mobilidade e das redes sem fio, estamos imersos no que alguns autores identificam
como uma nova relação com o tempo, com o espaço e com os diversos territórios. Trata-se de formas de compressão espaço-temporal (HARVEY, 1992), de desencaixe (GIDDENS, 1991), de desterritorialização (DELEUZE, 1980), de espaços líquidos (BAUMAN, 2001), de novos nomadismos (MAFFESOLI, 1997). Aqui entram em jogo crises de fronteiras: do sujeito, da identidade, do espaço geográfico, da cultura, da política, da economia."

"Se na cidade industrial os meios de massa configuram o espaço urbano (a imprensa, o rádio, o
telefone e a televisão foram e ainda são fundamentais para definir relações de trabalho, de moradia,
a constituição dos subúrbios e enclaves urbanos),"

"na cibercidade contemporânea estamos vendo se desenvolver uma relação estreita entre mídias com funções massivas (as “clássicas” como o impresso, o rádio e a TV), e as mídias digitais com novas funções que chamaremos aqui de “pós-massivas” (internet, e suas diversas ferramentas como blogs, wikis, podcasts, redes P2P, softwares sociais e os telefones celulares com múltiplas funções)."

O que são funções massivas e pós-massivas?

"Por função massiva compreendemos um fluxo centralizado de informação, com o controle editorial
do polo da emissão, por grandes empresas em processo de competição entre si, já que são financiadas
pela publicidade."

"As mídias e as funções massivas têm o seu (importante) papel social e político na formação do público e da opinião pública na modernidade. As funções massivas são aquelas dirigidas para a massa, ou seja, para pessoas que não se conhecem, que não estão juntas espacialmente e que assim têm pouca possibilidade de interagir. Não há estrutura organizacional nas massas, tampouco tradição, regras."

"As mídias de função pós-massiva, por sua vez, funcionam a partir de redes telemáticas onde qualquer um pode produzir informação, “liberando” o polo da emissão, sem necessariamente haver empresas e conglomerados econômicos por trás. As funções pós-massivas não competem entre si por verbas publicitárias e não estão centradas sobre um território específico, mas virtualmente sobre o planeta."

"Experiências na internet com blogs, gravadoras e músicos, softwares livres, podcasting, wikis, entre outras, mostram o potencial das mídias de função pós-massivas. Essas vão insistir em três princípios fundamentais da cibercultura: a liberação da emissão, a conexão generalizada e a reconfiguração das instituições e da indústria cultural de massa (LEMOS, 2004a, 2004b, 2005)."

"No entanto, devemos pensar em termos de função e não de dispositivo, já que as funções massivas e pós-massivas estão presentes tanto nas mídias analógicas como nas digitais. Por exemplo, um grande portal na internet ou um grande site de busca ou jornalístico tenta desempenhar funções massivas, enquanto que mídias analógicas como fanzines, flyers e rádios comunitárias buscam desempenhar funções pós-massivas, de nicho."

Quando elas se encontram...

"Podemos dizer, por exemplo, que a internet é um ambiente midiático onde existem funções massivas
(a TV pela Web, os grandes portais ou máquinas de busca) e pós-massivas (blogs, wikis, podcasts...).
A TV tem funções de massa (TV aberta) e pós-massiva, ou de nicho (como os canais pagos). Essa
nova configuração comunicacional, mais rica, já que nos oferece cada vez mais funções massivas e pós-massivas, vai causar uma crise e alguns impactos importantes para a configuração das novas relações sociais e comunicacionais (crise do copyright, “jornalismo cidadão”, software livres, trocas de arquivos em redes P2P, etc.)."

A reconfiguração
"Jornais fazendo uso de blogs (uma reconfiguração em relação aos blogs e aos jornais) e de podcasts. Podcasts emulam programas de rádio e rádios editam suas emissões em podcasts. A televisão faz referência à internet, a internet remete à televisão. A televisão usa promoções via celulares e SMS e os celulares veiculam, em alguns países, trechos de emissões da TV."

Relação: funções x cidade

"O cidadão da cidade industrial pode receber informações massivas, mas não tem muita mobilidade para produzir e enviar informações."

"Na comunicação massiva, o sujeito pode escolher como e que tipo de informação receber, mas não pode dialogar já que tem pouca possibilidade de emissão e de circulação de informação." (TV, rádio, espaços privados como casa, trabalho, carro)

"A atual configuração comunicacional nos coloca em meio a novos processos “pós-massivos” que vão permitir emitir, circular e se mover ao mesmo tempo. A mobilidade informacional é o diferencial atual."

"Mobilidades informacionais criam gestões fluidas do tempo e, consequentemente, do espaço. Não há descolamento entre os espaços e as correlatas mobilidades, mas a intersecção entre espaço eletrônico e espaço físico, criando os territórios informacionais."

Três princípios da cibercultura: emissão, conexão e reconfiguração
Ciberurbe: a alma virtual das cibercidades

"O que constitui essa nova prática da “comunicação de massa social” é o controle individual e a partilha coletiva da informação em mobilidade com alcance planetário e a difusão imediata."

"Dentre as tecnologias móveis, o telefone celular tem sido o dispositivo maior da convergência tecnológica e da possibilidade de exercício efetivo dessa “rebelião” política, mas também de constituição de relações sociais por contato imediato, seja por meio de voz, SMS, fotos ou vídeos."

"O território do beduíno high-tech não é o deserto, mas o território informacional criado pela intersecção do espaço físico com o ciberespaço nas metrópoles contemporâneas. Eles trabalham e vivem de conexão wireless em conexão wireless. Os novos “beduínos”, munidos de tecnologias sem fio como laptops Wi-Fi e smart phones, aliam mobilidade física no espaço público com a mobilidade informacional pelo ciberespaço"

"Definitivamente, à medida que vamos desplugando nossas máquinas de fios e cabos, à medida que redes de telefonia celular, bluetooth, RFID ou Wi-Fi fazem das nossas cidades máquinas comunicantes desplugadas e sem fio, paradoxalmente, vamos criando projetos que buscam exatamente o contrário: territorialização, ancoragem no espaço físico, acoplagem a coisas, lugares, objetos..."

Referência
André Lemos: Professor associado da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) / Cidades inteligentes: De que forma as novas tecnologias —como a computação em nuvem, o Big Data ea Internet das Coisas — podem melhorara condição de vida nos espaços urbanos?

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